14. fev. 2020

Defensoria do Rio de Janeiro pede proibição de ações policiais perto de escolas

A Defensoria Pública do Rio de Janeiro pediu nesta quinta-feira (13/2) a proibição de operações das forças de segurança no entorno das creches e escolas públicas estaduais e municipais nos horários de maior movimento. O objetivo é garantir o ano letivo de crianças e adolescentes, principalmente nas periferias.

Na ação civil pública, elaborada pela Coordenadoria de Defesa da Criança e do Adolescente (Cdedica), a Defensoria pede liminar que obrigue o estado do Rio a adotar uma série de medidas que priorizem o direito constitucional à educação. Em caso de descumprimento, a entidade requer a aplicação de indenização no valor de R$ 1 mil por dia de aula perdido aos alunos em razão dos tiroteios.

A Defensoria também pede a condenação do estado do Rio em R$ 1 milhão por danos morais coletivos, em razão da violência à qual crianças e adolescentes são diariamente expostos nas portas das escolas. O valor deverá ser revertido ao Fundo para a Infância e Adolescência e ser utilizado para o desenvolvimento de projetos que reduzam os danos causados aos estudantes impactados com a constante violência institucional.

Escolas fechadas
Segundo dados compilados na ação, as escolas municipais foram fechadas pelo menos 700 vezes no ano passado por causa da violência. Na rede estadual, 23 colégios tiveram as aulas suspensas pelo mesmo motivo em 2018, o que resultou em 59 dias letivos perdidos na área de abrangência que abarca, por exemplo, os bairros de Acari, Penha e Irajá.

Dados da plataforma Fogo Cruzado, que também embasam a ação, indicam a ocorrência de 6.059 tiros na região metropolitana do Rio até o fim de setembro do ano passado, dos quais 30% (1.819) foram no horário escolar e no perímetro de 300 metros de escolas e creches da rede pública e privada. Ao todo, oito pessoas foram baleadas dentro ou próximo de estabelecimentos de ensino em 2019, número 166% maior que o registrado em 2018.

Os disparos nas imediações de escolas, no período letivo de 2019, foram mais frequentes na zona norte e na zona oeste, com 695 e 369 dos registros, respectivamente. No nefasto ranking dos bairros, Vila Kennedy, que ficou conhecida como o “laboratório da intervenção federal”, ficou em primeiro lugar, com 103 tiros. Na sequência, estão a Cidade de Deus, com 92 episódios próximos a estabelecimentos de ensino; Complexo do Alemão, com 83; Tijuca, com 77; e Maré, com 44.

Impacto das operações
Segundo o defensor Rodrigo Azambuja, coordenador da Infância e Juventude da Defensoria Pública, o impacto da exposição à violência vai além da suspensão ou interrupção das aulas. Não raro, alunos e profissionais de ensino desenvolvem problemas de saúde físicos e mentais em consequência do estresse pós-traumático. A dificuldade de aprendizado, a evasão escolar e a alta rotatividade de professores são problemas comuns nas escolas das áreas conflagradas.

“Acordar ao som de tiros, ter que se agachar no corredor de uma escola às pressas e estudar ao som de rasantes de helicópteros geram, inevitavelmente, traumas nos alunos. As crianças e os adolescentes da periferia do Rio de Janeiro, infelizmente, encontram-se na linha de tiro da política de segurança pública fluminense, a qual tem levado a perda não só de aulas, mas de vidas, inviabilizando um espaço de aprendizagem seguro. As consequências advindas da violência urbana na vida de crianças e adolescentes, no entanto, não se limitam à saúde mental, mas também implicam violação a uma série de outros direitos que lhes são fundamentais”, afirmou.

Regras claras
Entre a série de pedidos feitos pela Defensoria na ação, destaca-se a concessão de liminar para obrigar o estado a seguir uma instrução normativa que proíbe operações policiais próximas a unidades de ensino e creches localizadas no Rio de Janeiro nos horários de maior fluxo de entrada e saída de pessoas, assim como a utilização desses estabelecimentos como bases operacionais das forças de segurança.

Essa mesma norma também prevê a criação de um protocolo de comunicação para que diretores de unidades de saúde e de ensino, na iminência das operações, tenham tempo hábil para adotar as medidas necessárias para reduzir os riscos à integridade física das pessoas sob suas responsabilidades.

A ação também pede a proibição de voos de helicópteros sobre as escolas, respeitando-se a distância horizontal de dois quilômetros de cada estabelecimento de ensino. A Defensoria requer a criação de um comitê de monitoramento para fiscalizar a educação em áreas com alto índice de violência urbana e operações policiais, a ser composto pela entidade, Ministério Público, OAB, conselhos estadual e municipal de Educação, Conselho Estadual de Defesa da Criança e do Adolescente e outros órgãos da sociedade civil.

A Defensoria Pública pede ainda a criação de um calendário para a reposição das aulas perdidas em razão da violência, a fim de garantir o currículo escolar previsto para o ano letivo e evitar o atraso acadêmico dos estudantes. A medida deverá ser comprovada mediante relatório a ser apresentado pelas unidades de ensino das redes estadual e municipal.

A entidade prevê também a prestação de serviço de assistência psicossocial e pedagógica para estudantes, assim como o treinamento de professores e demais profissionais das redes estadual e municipal de educação em estratégias integrais de gestão de riscos e de crises. A ideia é criar, em cada escola, grupos de suporte responsáveis pela orientação de pessoas durante a ocorrência de um tiroteio, por exemplo.

A ação pede, por fim, o reconhecimento das vítimas letais da violência, com a nomeação de escolas com seus nomes.

“É uma forma de reparação simbólica dos danos às comunidades afetadas, por meio do reconhecimento de que a política de segurança pública empregada vem gerando vítimas nesses locais. Por isso, pedimos na ação civil pública que os réus sejam condenados a nomear unidades escolares com os nomes das vítimas de operações policiais dos últimos cinco anos, colocando-se uma placa com a idade e a causa da morte da criança ou adolescente em ato público a ser realizado nesses estabelecimentos”, explica a defensora Beatriz Cunha, subcoordenadora da Infância e Juventude da Defensoria.

Recomendação ignorada
Distribuída à 1ª Vara da Infância e Juventude e do Idoso da capital, a ação civil pública foi elaborada após a Defensoria Pública encaminhar, no dia 24 de janeiro, uma recomendação ao governo do estado e à prefeitura com um conjunto de medidas a fim de preservar a segurança dos estudantes nos dias de operações policiais.

A Defensoria não obteve resposta. As principais medidas requeridas na ação civil pública constam no documento enviado antes do início do ano letivo de 2020. Com informações da Assessoria de Imprensa da DP-RJ.

FONTE: Conjur

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